Será mesmo que bandido bom é bandido morto?



Hoje, 2 de outubro, foi divulgado pelo Datafolha uma pesquisa solicitada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Os resultados informam que 57% dos consultados concordam com a frase “bandido bom é bandido morto”, enquanto 34% discordam. O restante, 6% não concordam e não discordam e outros 3% não sabem.

Lembro quando essa frase foi imortalizada pelo personagem Capitão Nascimento (Wagner Moura) no filme “Tropa de Elite 2: o inimigo agora é outro”. Em pouco tempo a internet foi inundada de imagens e montagens com esse bordão. Para muitos, se tornou uma filosofia que deveria ser adotada pela polícia em todo Brasil. Qualquer debate sobre violência e segurança, a ideia do “bandido bom é bandido morto” era sempre defendida. O detalhe importante nesse crescimento midiático que frase teve após o filme é o próprio FILME, a maneira como esquecem a história e, principalmente, com quem lutou e como terminou o herói do BOPE.

Como o próprio nome diz, “o inimigo agora é outro”, o filme mostra como o Cap. Nascimento descobre todo um esquema de corrupção na polícia, com a formação de milícias nas UPPs do Rio de Janeiro, e como essa organização trabalhava nos morros comandando o tráfico de drogas, assassinatos, e toda a ligação com a política, ajudando e sendo ajudado por políticos em troca de votos. E, para desespero de muitos extremistas da direita, o mesmo herói que falou “bandido bom é bandido morto”, precisou da ajuda de um representante dos “Direitos Humanos” para conseguir derrubar “o sistema”, como ele mesmo definiu. As cenas finais do filme, junto com o depoimento do personagem principal, insinuam claramente que os principais Bandidos não estavam nos morros e favelas, estavam em gabinetes e em Brasília. Eram eles que gerenciavam e se favoreciam do Sistema.

Utilizei o filme como exemplo de que frases prontas não podem ser usadas como verdades absolutas. Se quando falamos que “bandido bom é bandido morto”, pensamos logo no “neguinho pobre com uma arma na mão”, ou, no “homem de chinelo sem camisa dentro do presídio”, então sim, estamos sendo racistas e preconceituosos. Um político engravatado desviando dinheiro consegue matar muito mais pessoas que um assaltante armado. É esse dinheiro da corrupção que falta para saúde, que não permite aos hospitais e postos de saúde atenderem a população, pagar salários dignos para os médicos e proporcionar locais adequados para todos. São os “doutores” de terno que roubam os investimentos em segurança, deixando a própria polícia sem condições para trabalhar e a população enjaulada em casa.

Defender a ideia que “bandido bom é bandido morto” é como afirmar que nosso judiciário é incompetente e nosso sistema prisional inútil, escolhendo por desistir de tudo e partir logo para o extremo. Só que esse extremo é direcionado por nossos pré-conceitos e ideologias, o que leva um direcionamento de maneira desproporcional e apenas para uma parte da população.

Deveríamos é questionar as razões pelas quais nosso judiciário não é “justo” e porque nosso sistema prisional não está funcionando, para então, conseguirmos as respostas para tentar resolver esses problemas. Exemplos claros. Como podemos acreditar na justiça quando ele trata alguns acusados como “doutores” e outros como “marginais”? Como podemos acreditar em recuperação na prisão se colocamos no mesmo espaço um traficante, um assassino e um homem que foi preso por roubar comida, e às vezes até um inocente preso por engano.

Enquanto a sociedade não for justa, sem racismo ou preconceitos, não tem como defender a filosofia do “bandido bom é bandido morto”. Ainda mais em uma sociedade em que 70% afirmam que a polícia comete excessos de violência, 53% têm medo de ser agredidos pela polícia civil e 59% pela polícia militar, conforme a mesma pesquisa revelada pelo Datafolha.

Em resumo, a sociedade que pede para a polícia matar os bandidos é a mesma que têm medo da própria polícia, porque acredita que ela é violenta. Estamos falando de 70% dos entrevistados afirmando que a polícia comete excessos de violência.

A pesquisa é preocupante. Se a polícia é um reflexo da nossa sociedade racista e preconceituosa, apenas confirmará a razão da população mais pobre ter medo dessa polícia e reclamar do excesso de violência.

Não digo isso para colocar a polícia como culpada, mas para demonstrar que precisamos repensar os conceitos definidos e falados popularmente. Não tem como melhorar uma nação que acredita que “direitos humanos só defende bandido” e “polícia foge dos bandidos e só prende inocente”.

Tanto não declaro como culpados, como vou utilizar outros dados da pesquisa para defender os profissionais da segurança pública. Para os entrevistados 64% acreditam que os policiais são vítimas de criminosos e 63% acreditam que os policiais não têm boas condições de trabalho. E aqui no Rio Grande do Sul ainda recebem seu salário parcelado. Sim, esses profissionais são heróis.

Quando a sociedade mudar seus conceitos, a polícia vai mudar também. Até lá, não tem como defender uma filosofia dessas em Brasil como é o nosso. É só olhar os comentários na internet após essas informações, pessoas dizendo que 34% dos entrevistados são vagabundos porque discordam da frase. Em breve dirão que 70% das pessoas são bandidas, por isso dizem que a polícia comete excessos de violência.

O Brasil precisa de uma reforma no judiciário, no sistema prisional, na segurança e, principalmente, na mente das pessoas.

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